quarta-feira, 26 de setembro de 2012


UM ANO SEM SERGIO BONELLI!
Texto de Mauro Boselli pelo passamento de seu amigo Sergio Bonelli, publicado na seção "dal buio" de Dampyr :

"Atrás da porta fechada, os crocodilos entalhados, as estatuetas tribais, as fotos da Amazônia, as pilhas de cartas... Os quadros nas paredes: os quadros de Alberto Martini, de Dino Buzatti, os oníricos, os visionários inquietantes... etc. E as mulheres elegantes, de Crepax, Manara e Molino... E os CD´s: Wurfritzer, com canções francesas, a Bossa Nova, Trenet, Jobim, Stan Getz, Billie Horlliday... E os quadrinhos! Os quadrinhos... os dos anos 30, Nerbini, o Vitorioso; O Audaz. E na vista, nos corredores: Johnny Hazard; Brick Bredford; Vírus, o Mago; Mickey Mouse jornalista, os heróis da infância, das longas férias na Ligúria. As sombras sem paz dos desenhistas desaparecidos, Pratt, Battaglia, D´Antonio... Os quadros com as corridas, a sala de reuniões, com as páginas espalhadas, as cartas que precisava responder, os livros... as estantes repletas de livros, de livros, de livros... Sobre o Oeste, sobre a América, o cinema, as viagens, as ilustrações, os romances dos amigos, onde procurava os erros... Os velhos filmes de cowboys, o jazz de Naviglie, os jornais debaixo do braço pela manhã, os cineclubes misteriosos, os locais alternativos e restaurantes elegantes, almoços, as cenas... E assim tantos encontros, os telefonemas, os apertos de mãos, as histórias... O Brasil, o Saara, a Espanha e os passeios no Pó... E não digo mais... Ainda está aí? Posso ir em frente, agora que Sergio não existe mais? 

Quando desaparece uma pessoa, desaparece um mundo.Ainda mais se essa pessoa se chama Sergio Bonelli e acompanhou a minha vida e aquela de tantos italianos, tudo sem ele parece mais triste e desbotado. É assim que me sinto agora e não quero esconder. Não devemos ficar irritados com a morte. Sergio Bonelli era assim pleno de interesse, de curiosidade de vida, que a notícia de que se foi, parecia incrível. Um pesadelo. Mas depois, visto que não vinha para o escritório, entendemos que não viria mais, ele que não faltava ao trabalho, um dia sequer, exceto quando navegava numa canoa no Rio Orinoco ou viajava de jeep no deserto. E, desses locais, nos telefonava! Então nós não paramos, como ele nunca parou. Sabemos que coisa queria, somos "bonellianos" até a raiz do cabelo! Nós temos no nosso interior o nosso editor... Mas não o temos mais! Puxa vida! Maldição Mister No. No sábado ou domingo, passando entardecer sob as cortinas da Rua Buonaroti, não veremos mais a luz acesa no primeiro andar. Sergio estava ali, no seu grande escritório deserto, a sua casa. Corrigia páginas, escrevia Tex ou Mister No, com desenhos. Às vezes eu o encontrei por lá. Agora não o farei mais. Tinha começado a argumentar para ele e às vezes corrigia minhas páginas, bronqueava... Melhorar esperar a segunda-feira e ouví-lo dizer: "Tenho algumas correções. Talvez não gostará". Ficava nervoso e todos se calavam. Mas depois o telefone tocava na minha casa: "Oi, sou eu, Sergio". Como aquele telefonema no domingo de Páscoa para me dizer que nosso livro estava entre os mais vendidos. "Peste!" Como diria Tex. Ele dizia que era melhor não publicá-lo, mas então não era verdade que pensava assim. Ele que sempre publicou todos, não vetando nenhum. Ele tinha suas regras, mas em seguida liberava. Ele que presenteou Groucho a Dylan Dog, El Muerto a Tex, Zagor, Chico, Mister No e Esse-Esse a todos nós. Eu pensava que "Caça ao Homem" não fose o verdadeiro Tex, mas agora quero dizer-lhes que re-li aquela história. É uma obra de arte. Uma obra de arte, ponto e basta. E me faltarão os seus ilegíveis apontamentos, suas lamentações, trabalhando nas tardes quentes sem ar condicionado e ele de manga longa. Me desculpe por não ter escrito em tempo sobre Ronald MacKenzie. Me desculpe por não poder-lhe ler a história de Dampyr sobre a Grande Guerra, onde coloquei, em sua homenagem, a canção "Rose of Picardy":"E as rosas morrem no verão...". Você, querido Sergio de fato nos fez acreditar que era imortal! Mas não era verdade. "Eu pensei assim", como disse o Inspetor Cip, e você amava dizer. Obrigado a você pela nossa juventude eterna. Agora concluiu-se de verdade. Adeus!



Mauro Boselli

Nenhum comentário: