Dampyr #248 - O lobisomem de Matera
Álbum ambientado na cidade dos Sassi, entre licantropos e freaks
No ano de 2020 comemora-se os vinte anos de Dampyr, série que estreiou nas bancas em 2000, está por concluir-se. Não faltaram e não faltam belas histórias dedicadas ao personagem idealizado por Mauro Boselli e Maurizio Colombo. Nestes dias, além do explêndido Dampyr Especial, com influências Salgarianas, escrito pelo grande Boselli e desenhado por Marco Villa, encontramos nas bancas, o aguardado álbum ambientado em Matera, que tem relação com alguns elementos de um episódio escocês de alguns anos atrás (Mal de lua, Dampyr # 161) e represente um novo capítulo do percurso artístico (por nós muito apreciado) da dupla Giusfredi/Fortunato.
É inerente à natureza da série concebida por Boselli e Colombo, o conceito de misturar folclore e mitologia local com o elemento sobrenatural e de terror, muitas vezes colocando ênfase na ambientação, e este episódio respeita (e faz o melhor uso disso). Fruto de um roteiro que mistura habilmente drama, sentimentos, mitologia e ação, "O lobisomem de Matera" é na verdade uma história que prospera em atmosferas, que captura de maneira vívida e envolvente o espírito de um lugar ancestral como os Sassi de Matera, tornando o coração da cidade, o verdadeiro co-protagonista da história, mais do que um simples (e fascinante) teatro percorrido pelos protagonistas. Um lugar marcado por um passado difícil e complexo, mas permeado de uma energia única que o tornou um destino turístico de relevância mundial nas últimas décadas. Em suma, a cidade é perfeita para a visão romantico-sombria do autor Giorgio Giusfredi e do desenhista Alessio Fortunato, um pouco, a marcada dessa parceria artística está aliada a influências cinematográficas (como já havíamos destacado ao falar de Planeta de Sangue e A amiga mortal - voltaremos à discussão de influências mais tarde).
Uma importante metáfora está escondida por trás do elemento fantástico/sobrenatural, ou seja, narrando as consequências do abandono e do desejo de ser aceito e amado. O tema da diversidade, portanto, declinou em um contexto de terror sempre mantendo um certo interesse no desenvolvimento conceitual.
O álbum em questão não é uma "simples" história de lobisomem, mas consegue reinvocar sabiamente um passado de cerca de cem anos atrás, entre freaks e estranhos fenômenos, uma narração que segue entre duas linhas temporais para contar contextualmente, no presente, uma investigação de Harlan, Tesla e Kurjak. Entre os personagens, marcamos o retorno de Stuart Morrison que, na turnê italiana com sua banda, dá uma parada em Basilicata. Stuart sonha com seu velho mestre já falecido, Duncan e seu pai, o príncipe Ayldon dos Shee, conectando assim claramente alguns elementos importantes para a continuidade da série.
Como dissemos anteriormente, a ligação das histórias de Giusfredi & Fortunato continua a ser indissolúvel. Entre as referências cinematográficas, uma das mais evidentes está na cena de abertura, que homenageia o início de Batman Returns de Tim Burton, nas cenas que narram a origem do Pinguim, onde os cônjuges Cobblepot, horrorizados com as feições da criança, decidem abandoná-lo em um rio.
Ficando no cinema, muitas das cenas ambientadas no passado, entre freaks e nazistas, têm um sabor deliciosamente cinematográfico a tal ponto que algumas páginas trazem à mente o trailer do filme Freaks Out de Gabrieli Mainetti, que será lançado nos próximos meses (provavelmente uma simples coincidência e inspiração comum, uma vez, que o filme foi rodado simultaneamente ao lançamento deste álbum).
Ficando no tema das inside joke, impossível não acrescentar a anedota de que em cada história desenhada por Fortunato, por confissão do próprio artista, há rostos retirados do mundo real, pessoas que conhece ou cita. Assim, nesse episódio podemos observar nada menos que dois desenhistas de quadrinhos, Gipi e Giuseppe Palumbo, vestes panos ede dois personagens com um papel fundamental (sobretudo o primeiro) dentro da trama, Poucas páginas depois um olhar atento capturará uma outra simpática citação, um ciclista com a camiseta de Zagor, homenagem de Giusfredi a um dos personagens Bonelli que mais ama (e do qual realizou algumas histórias).
Uma nota também sobre a relação da história com a atualidade. Mesmo que o álbum não esteja ambientado exatamente na "nossa realidade", este 2020, marcado pela emergência sanitária da Covid-19, mostrando-nos personagem que circulam livremente por Matera e organizam shows e confraternizações sem serem submetidos a nenhuma restrição, no último quadrinho na página 61 é mostrada uma máscara abandonada no chão, como se quisessem relembrar a difícil relação com a contemporaneidade, visto que os autores trabalharam nessa história ao longo de 2020. Faltam alguns comentários aos desenhos de Alessio Fortunato, que aqui chega ao seu ápice expressivo. A obra do chamado "artista da caneta", caracterizada por uma meticulosidade quase maníaca e um olhar sempre atento aos detalhes, mostra-se em permanente evolução, capaz, com seu trato peculiar e único, fazer sobre o papel atmosferas, luzes, sombras, sugestões. Empolgado por ter de representar lugares queridos e próximos a ele, o desenhista da Puglia interpreta o roteiro no seu melhor, agregando valor em uma das mais belas histórias desse ano.
Não é por acaso que as páginas do álbum foram expostas, antes mesmo da publicação da história, na cidade de Sassi, no cenário evocativo da Mostra Sassi, Nuvole e Lupi, organizada pela APT Basilicata e Matera Film Festival e promovida pela Lucca Changes em colaboração com a Sergio Bonelli Editore.
Il sommo Giuseppe
Dampyr: "O lobisomem de Matera"
NUMERO: 248
DATA: novembro 2020
SERGIO BONELLI EDITORE
ARGUMENTO E ROTEIRO: Giorgio Giusfredi
DESENHOS: Alessio Fortunato
CAPA: Enea Riboldi
Matéria publicada originariamente no blog: www.gliaudaci.blogspot.com