terça-feira, 25 de setembro de 2018


Dampyr #222 - O Suicídio de Aleister Crowley

O sentimento de inquietude de Boselli


Fazer a biografia de poetas e pessoas que realmente existiram é assunto integrante e fascinante: é este um dos desafios que o co-criador de Dampyr, Mauro Boselli enfrentou durante a elaboração dos textos deste episódio. Depois da apreciada trilogia dampyriana publicada entre abril e junho passados (das quais já falamos), plena de golpes de cena e de acontecimentos e reviravoltas, Boselli retorna então aos textos em uma nova história plenamente inserida da continuação da série. Neste álbum o vulcânico autor milanês, com desenhos de Michele Cropera, tenta-nos contar sobre a famosa questão que há por trás do encontro entre o maior escritor português de todos os tempos, Fernando Pessoa, e, o mais importante e inquietante esoterista e ocultista moderno, Aleister Crowley.
É muito curioso como recentemente (e por recentemente, entendemos esse verão) se acendeu um grande interesse pelo encontro entre estas duas figuras. Nos referimos ao longo artigo escrito por Andrea Scarabelli para o seu blog em 4 de junho; ou aquele de Claudio Gallo para o La Stampa em 8 de junho; dentre outros.
Tudo isso porque, no mês de maio, foi publicado "A Boca do Inferno", de Fernando Pessoa - Aleister Crowley, tendo como curador Marco Pasi, para as edições Federico Tozzi em Saluzzo.
Pela primeira vez estão à disposição dos leitores, críticos e apaixonados, os documentos relativos ao encontro entre os dois, a correspondência integral e o famigerado romance escrito por Pessoa.

Seria bom perguntar a Mauro Boselli quanto tempo atrás a história dampyriana, focado precisamente nesses dois personagens que agora se encontram novamente sob os refletores, já estava concebida, escrita e, enfim, realizada.
Em todo caso nos parece interessante anotar como mais uma vez, o quadrinho se demonstra um meio de expressão perfeitamente capaz de externar quando se move o mundo da cultura. 
Da outra parte, não temos apenas Crowley e pessoa nesta história. O enigma ligado ao misterioso desaparecimento de Crowley, realmente acontecido em 1930 entre as águas da "Boca do Inferno", é o fio condutor de uma história que se religa aos Grandes Antigos lovecraftianos (que já apareceram diversas vezes na saga dampyriana) e para a aterrorizante cidade de R´lyeh, outra parte do imaginário do autor visionário de Providence.
Além dos tantos referimentos, o mérito dos primeiros dois terços do episódio consiste em reinvocar nas páginas de um quadrinho, a atmosfera de uma cidade, Lisboa, e mostrar seu coração pulsante, entre melancolia e fado (a tradicional canção portuguesa).
A história, em si, não é uma das aventuras dampyrianas mais emocionantes criadas pelo "Boss", por causa do espaço muito limitado para ação (relegada substancialmente às cenas finais), mas representa uma fascinante reconstrução histórico-literária no melhor Boselli Style em que convergem todas as mais grandes paixões do nosso incansável autor: a literatura e sem faltar, o horror.
Visualmente, Michele Cropera realiza um trabalho que exalta as cenas em que emerge o lado fantástico, entre monstros (obviamente lovecraftianos), ambientações bem apuradas e geometrias paradoxais escherianas. A evolução estilística mais recente conduziu o ex-desenhista da Lazarus Ledd a utilizar mais apuração para o preenchimento, com resultados não tão eficazes mas de notável atmosfera. 
Um episódio interessante e culturalmente estimulante, não livre de defeitos, mas no geral, acima da média da série.
 
Rolando Veloci & Il Sommo
 
 
 
Publicado originariamente no blog: www.gliaudaci.blogspot.it

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